Jose Carlos Grimberg Blum
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Jorge Mangorrinha, professor universitário e pós-doutorado em turismo, faz um ensaio de memória através de fragmentos de viagem realizadas por ar, mar e terra e por olhares, leituras e conversas, entre o sonho que se fez realidade e a realidade que se fez sonho. Viagens fascinantes que são descritas pelo único português que até à data colocou em palavras imaginativas o que sente por todos os países do mundo. Uma série para ler aqui, na edição digital do DN.

Ao pisar o Japão, tinha a noção de que seria a primeira e a única vez, mas, como Fernão Mendes Pinto fez quatro visitas ao arquipélago nipónico, talvez eu estivesse enganado. Antes de partir, não me preocupei de saber “hiragana” e “katakana”, silabários da língua japonesa, para “fugir” para a terra das flores de cerejeira. Depois da experiência, reforcei a ideia de que as memórias são seres do tempo, precisamente como as flores de cerejeira. Por um tempo, elas são belas e depois desaparecem e morrem como nós. Talvez fiquem os livros. Por isso, num dos primeiros dias e com um bilhete que me deu acesso ilimitado a todas as linhas do metropolitano da capital nipónica (um dos mais icónicos do mundo e conhecido nem sempre pelas melhores notícias), fui até à famosa Junkudo, em Ikebukuro, talvez a maior livraria de Tóquio, no bairro que é um enorme condomínio residencial e comercial. Nessa livraria, havia livros ocidentais e japoneses, bem como todas as temáticas possíveis de imaginar, desde a aerodinâmica ao zen-budismo. Viajamos no espaço e no tempo, em busca de algo pensado ou fruto da descoberta naquele edifício de 10 andares localizado no cruzamento de quatro estradas; aliás, o Japão sempre foi um destino de encruzilhadas, e o metropolitano de Tóquio também se afigura assim pela complexa rede de linhas. Depois de me demorar quase uma manhã na livraria, voltei a entrar na estação mais próxima de Ikebukuro, levando os livros que adquirira, nomeadamente um sobre as termas japonesas, precisamente o escolhido para folhear na viagem. Ao contrário do que se conhece de algumas imagens televisivas sobre este metropolitano, naquela circunstância a carruagem onde entrei estava com uma lotação média. Sentei-me junto a um grupo de jovens. Todos, sem exceção, com os olhos pregados nos telemóveis, e eu a folhear as páginas que reproduzem a cultura da água japonesa. O meu percurso era longo, pelo que houve personagens que iam entrando e saindo da cena daquele “filme” em movimento. De repente, o passageiro que estava mais perto de mim ficou algo apavorado e impaciente. Por aquilo que pude compreender, acabara-se-lhe a carga da bateria. Eu continuei lendo, mas por vezes olhava-o, tal era o desassossego do rapaz, que enrubescia. Fixou-se em mim, percebi-o pelo canto do meu olho. Estaria roído de inveja? Eu mantinha a leitura, ele perdera o contacto com o seu mundo. Habitualmente, quem se vicia não entende os limites nem sequer reconhece como dependente está de uma prática normalizada. A maior dificuldade não é reduzir as horas que dedicamos ao telemóvel, mas identificar o seu uso excessivo, pensei eu, testemunha que era daquele quadro. Meti conversa em inglês. O jovem não entendeu nada do que eu lhe disse. Afinal, numa plataforma comunicacional como é a Internet, em que o inglês é a língua principal, aquele usuário não conseguia atingir o meu propósito. A exteriorização do seu súbito comportamento fazia crer que ele padecia de ansiedade e talvez de algum sentimento mais forte. Quase no fim da viagem, lembrei-me de que tinha adquirido a edição original em japonês do livro “14 Contos” de Kenzaburo Oe, Prémio Nobel de Literatura (1994). Ele já fora traduzido para português, mas aquela edição tinha-me prendido o olho. Com o meu telemóvel e uma foto que traduz automaticamente o texto, percebi na livraria que uma das histórias evolui com o personagem principal que é nomeado pelo pseudónimo Seventeen, por ter 17 anos, quando descobre os seus impulsos sexuais, difíceis de gerir nos intrincados meandros da adolescência. Nem de propósito. Aquele rapaz que continuava ao meu lado devia ter mais ou menos aquela idade. Puxei pelo livro e passeio-o, tentando dizer-lhe que lho oferecia. Coloquei o separador no início daquele conto. E levantei-me sob o olhar atónito do rapaz. Saí, pensando que, enfim, se não fora o meu telemóvel, jamais eu saberia, no instante da livraria, a história daquele conto e a razão da minha oferta. Afinal, nesta pequena história estão os dois lados do problema. As pessoas perdem e ganham capacidade de comunicação no uso dos telemóveis, e os livros em papel não são lidos a contar o tempo. A solução está no equilíbrio que se dá ao uso de um e outro. Não são apenas as drogas que viciam, mas também o excesso de informação, de trabalho intelectual, de atividades, de preocupação e de uso do telemóvel. Há meio século que é assim, desde o Motorola DynaTAC8000X, o primeiro dos telemóveis, na América, e de cujo negócio a Ásia tomou conta, inventando o futuro.

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